sábado, 2 de novembro de 2013

À luz do luar

À luz do luar


autor Thiago D. Trindade


“Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos disse: por que cogitais o mal em vossos corações?” Mateus, 9: 4





Queria se matar. Sem a amada não valia à pena viver. A dor que sentia era devastadora, mas acima de tudo não entendia do porque ter sido traído e abandonado. Dera tudo a Elisa: carinho, dedicação e bens. Dera, sinceramente, seu coração.

Agora, seu coração estava despedaçado e não havia mais sentido em viver. Desgrenhado, emagrecido e sujo, Osvaldo se via diante do frasco de veneno. Trêmulo, segurava o copo mortal e lágrimas ardiam em seus olhos cansados. A dor era muito grande.

Um último lance. Decidiu abrir a janela, pois o quarto estava muito abafado. A luz da lua chamou sua atenção. Prateada e cálida, a lua cheia se refletiu nos olhos avermelhados do homem.
- Maldita seja – rosnou Osvaldo – dizem que você inspira os amantes, que seja agora testemunha de minha morte!
- A lua não tem ouvidos, amigo. Disse uma voz vigorosa.

Debruçado no muro baixo da casa de Osvaldo, um homem de paletó claro fitava o dono da casa com um meio sorriso. Nas mãos dele estava um chapéu elegante. Osvaldo murmurou um palavrão e esboçou regressar para dentro de seu santuário mortal.
- Por que você quer se matar e deixar as coisas boas da vida? Indagou o sujeito na calçada.
- Vá te catar! Gritou Osvaldo, com a voz esganiçada.
- Vou sim, meu caro – retrucou o outro – cada pedacinho meu é inestimável! O baratinho aqui é você.
- Você nunca sofreu por amor! – volveu Osvaldo – não sabe como é perder o amor verdadeiro!
- Já sofri muito por amor – atalhou o homem com um suspiro – o amor é muito mal interpretado meu chapa...
- Meu amor é puro! – exclamou o potencial suicida – sem Elisa não vale nada!
- Então o nome do problema é Elisa? – disse o homem fitando seu chapéu – ouça, amigo, o que você tem por essa moça é posse e não amor. Posse é egoísmo. Se você a amasse de verdade, gostaria de vê-la feliz. Vê-la crescer. Alem disso, outra coisinha...
- Acha que devo dividir Elisa com outros?! – explodiu Osvaldo – você não está falando sério! Idiota!
- Não distorça o que falo, rapaz – ponderou o outro – não ouviu direito o que eu disse? Vou tentar te explicar por outra abordagem... Você diz que ama Elisa. Que somente você pode amá-la verdadeiramente. Pois bem, quem ama cuida, meu chapa. Todos nós devemos nos amar, cuidar uns dos outros. Para poder amar um terceiro, por exemplo, a adorável Elisa, é preciso que você se ame em primeiro lugar.

O homem então riu e seus olhos se voltaram para a lua silenciosa. Osvaldo fitou o copo de veneno.
- Para você amar Elisa, de verdade, é preciso que se ame primeiro – repetiu o estranho – por que tu vais te portar como um fraco e fugir para o crime hediondo que pretende?! Ouça, mano, a vida é bela! Faça um favor para si e para Elisa... Cresça! Pegue esse seu orgulho e o quebre! Tem tanta coisa boa por aí...
- Não agüento a solidão...Hesitou Osvaldo.
- Não existe ninguém sozinho, nem mesmo aqueles que se esforçam muito para assim o serem – disse o outro em tom professoral – sempre há companhia compatível com o que se trás dentro de si.
- Tudo aqui lembra Elisa! Teimou Osvaldo.
- Guarde o que for bom e despache o resto – continuou o estranho – se necessário for, livre-se de tudo. Não existe fim, parceiro, mas sim possibilidades infinitas!

Osvaldo olhou o copo de veneno. Sentiu-se mais forte. Percebera que não vivera com Elisa desde sempre. Conhecera alegrias antes dela.
- Jogue esse negócio fora! Insistiu o homem quase pulando o muro.
- O que será de mim? Indagou Osvaldo, numa súbita fraqueza.
- Você será o que fizer de si. Disparou o outro.

Osvaldo jogou o veneno no chão e o som do copo se espatifando soou estridente noite á fora. O ex-quase-suicida parecia remoçado.
- Vamos agitar um pouco? Convidou o estranho, com um olhar matreiro.
- Não sei... Murmurou Osvaldo.
- Ponha uma roupa bacana – sentenciou o outro – espero aqui.

Osvaldo entrou e pôs uma roupa elegante. Sentia-se deslocado, mas algo dentro dele o ajudava. Saiu da casa. Encontrou com o homem estranho encostado num poste do outro lado da rua. Seu chapéu panamá branco estava em sua cabeça e os olhos do enigmático amigo se encontraram com os de Osvaldo.
- Para onde vamos? Indagou o homem que começava a se recuperar da dor.
- Confia em mim? Desafiou o outro.
- Confio! Exclamou Osvaldo com uma sinceridade que até o assustou.

Ambos riram e fitaram a lua. Um vento fresco tocou o rosto dos dois homens.
- À propósito, meu nome é Osvaldo.
- Me chame de Zé.

Os dois amigos apertaram as mãos enérgicamente e saíram para um novo começo e Osvaldo se reencontrou, aprendendo a amar verdadeiramente.










No tempo de Jesus, em razão das idéias restritas e materialistas da época, tudo era limitado e regionalizado. A Casa de Israel era um pequeno povo, os gentios eram também pequenos povos que moravam ao redor. Hoje, as idéias se universalizam e se espiritualizam. Os ensinamentos espirituais já não são privilégio de nenhuma nação e para eles não existem mais barreiras, pois estão presentes em toda parte. As verdades espíritas triunfarão pouco a pouco, assim como o cristianismo triunfou sobre o paganismo. Não é com armas de guerra que se combatem aqueles que não compreendem a verdade, mas com a força das idéias.


Fragmento retirado do Evangelho Segundo o Espiritismo, Capítulo XXIV, Não procurem os gentios. Item 10.





esse e outros contos podem ser lidos na obra Contos de Redenção, e, todo o capital obtido é revertido integralmente para o Asilo de Idosas Seara de Luz, do Centro Espírita Pai Congo de Cambinda (paracambi-RJ), que ainda mantém dezenas de atividades sociais para a população carente.



a listagem dos contos

A listagem de contos:

A tempestade......................................................................06

O tronco............................................................................13

O mendigo..........................................................................20

Araçari................................................................................25

A encruzilhada...................................................................33

A honra.............................................................................46

O jardim............................................................................51

O seguidor..........................................................................61

O defunto................................................................... ......65

O Jesuíta e o Pajé................................................. ............74

O preço.............................................................................81

À luz do luar......................................................................86

O perdido...........................................................................91

Perdas e ganhos.................................................................98

O orador...........................................................................103

O lavrador........................................................................110

Sebastião..........................................................................124

2 comentários:

  1. Zé!!!!!!!! Salve a luz de todos os Zés!

    ResponderExcluir
  2. Que belo texto! Doce e profundo!

    Viva os trabalhadores do BEM! Viva a Doutrina de Jesus

    Olavo Silva

    ResponderExcluir