Autor Thiago D. Trindade
A busca pela “pureza doutrinária”, que se verifica no Movimento Espírita atual, levou a um
distanciamento do sentimento humano. Lágrimas, por exemplo, são proibidas por
alguns militantes do Espiritismo para não demonstrar fraqueza moral e falta de
compromisso com a Doutrina. A falta de bom humor é considerada solidez moral.
Como são famosas as lágrimas e piadas de Chico Xavier! Não foi o médium mineiro
quem vivenciou integralmente o Espiritismo? Pode ser sério sorrindo, acenando e
abraçando, e, moralmente fraco vivendo de semblante fechado e sem estender os
braços, em um reflexo do que há dentro de seu Espírito imortal.
Há quem alegue
que Jesus e os apóstolos não riam, abraçavam. Mas o primeiro feito do Cristo,
conforme está registrado em João (2:11) quando a água é transmutada em vinho. Esse
“milagre” foi em uma festa de
casamento. Será que Jesus não deu nenhum sorriso, ou dançou com os convivas
porque ele era o Cristo? Pensemos, a Bíblia tem tantas informações
importantíssimas que seria perda de tempo lermos quantas vezes o Governador
Espiritual do planeta gargalhou, assoviou ou penteou os cabelos.
Nos últimos anos
vem surgindo autores espíritas que tem quebrado algumas correntes da “pureza doutrinária”, buscando conteúdo
antes da forma. Reconhecendo trabalho de entidades espirituais fora dos padrões
eurocêntricos, sobretudo registrando, como já escrito, a inserção de Espíritos
que são ditos como “Entidades de uma
religião específica” como Trabalhadores do Bem. Os Espíritos Trabalhadores
do Bem, portanto não estão irremediavelmente anexos a determinado culto, mas a
algo maior, tenha qual nomenclatura for. Muitos Espíritas, ainda com certo grau
de espanto, se descobriram acompanhados espiritualmente por tais Entidades “presas a uma religião”, e perceberam o
quão profundo é o conhecimento de tais Espíritos sobre a Doutrina Espírita, ou
melhor, dos Ensinamentos de Jesus. Bem, nosso Mestre foi para a cruz, por obra
dos fariseus que afirmavam que Jesus feria a “pureza doutrinária” do Judaísmo. Mais tarde, em defesa da mesma
“pureza doutrinária” a Inquisição, que de santa não tinha nada, trucidou
milhares de pessoas que divergiam de seus dogmas. E hoje continuamos vendo esse
tipo de absurdo dentro de várias correntes, inclusive dentro do Espiritismo.
O leitor
desavisado poderia concluir que estamos estimulando a “umbandização” (ou algo parecido) do Espiritismo. Longe disso! O “abrasileiramento” do Espiritismo começou
com o Espírito Emmanuel, que procurou tornar a Doutrina mais compreensível a nós,
através de atitudes cotidianas e pessoais. Nossa proposta é levar ao leitor a
uma interessante percepção das práticas doutrinárias e de como isso pode
ajudá-lo em sua evolução moral, a partir do não julgamento, da curiosidade
salutar e da compreensão de que há uma grande variedade de olhares a respeito
de uma Verdade, que é o Amor Fraternal.
Hoje grande
parte do Movimento Espírita está engessado em duas péssimas
características: soberba e distanciamento do sentimento. A primeira é porque
muitos espíritas estão se julgando superiores moralmente em relação a membros
de outras correntes filosóficas. O segundo está intensamente relacionado a
primeira (não poderia ser diferente) e promove o afastamento interpessoal, a
fim de não se demonstrar fraqueza ante as vicissitudes da vida.
Orar e vigiar,
conforme ensina Jesus, não é abraçar a soberba e o distanciamento do
sentimento. Orar é manter padrão mental elevado e a vigilância e estar
preparado moralmente para vencer os obstáculos necessários a seu crescimento
evolutivo. É participar intensamente do mundo e não se isolar dele – e de si
próprio. Até porque, segundo o que encontramos no livro Evangelho Segundo o
Espiritismo, no capítulo 17, oportunamente chamado Sejam Perfeitos, observamos que o verdadeiro espírita e aquele que
se esforça em vencer suas más tendências, e, por conseguinte ascender
moralmente. Ora, um católico, um protestante, umbandista, budista, etc. também
não têm que vencer suas imperfeições da mesma maneira, esforçando-se?
Cristo assevera
que seríamos reconhecidos como seus discípulos, unicamente, por muito nos
amarmos, apesar de sermos tão diferentes uns dos outros. Kardec, embasado nessa
verdade, asseverou “Fora da Caridade não
há Salvação”, logo debater o que é ou não Espiritismo, conforme tanto se faz,
acaba indo para o campo estéril da perda de tempo, gerando discussões
improdutivas e até obsessões. A verdadeira pureza doutrinária, portanto, em
cima dos ensinamentos de Jesus e reforçados por Kardec, é apenas a pureza do Amor
Fraternal. Todo o resto, como já dito, é de menor importância.
Para finalizar a
primeira parte, ficaremos com Allan Kardec, na obra “O que é Espiritismo”:
O que o
Espiritismo mais toma a peito é evitar as funestas conseqüências da ortodoxia. A sua revelação é uma
exposição livre e sincera de doutrinas, que nada têm de imutáveis, mas
que constituem um novo estádio no caminho da Verdade Eterna e Infinita. Cada um
tem o direito de analisar-lhe os princípios, que apenas são sancionados pela
consciência e pela razão. Mas, adotando-os, deve cada um conformar com eles a
sua vida e cumprir as obrigações que deles derivam. Quem a eles se esquiva
não pode ser considerado como adepto verdadeiro. (KARDEC, 1859). (Grifo nosso).
texto oportuno!
ResponderExcluirTiago finalizou 2016 e começou 2017 com verdadeiras pérolas! Parabéns professor!
ResponderExcluirVanessa Araújo, São Paulo
Texto excelente! atual e provocativo. Que os puristas revejam sua tosca posição, que é um verdadeiro desserviço à doutrina de Jesus.
ResponderExcluirCarlos Alberto Dias da Costa.